Os Economistas e a arbitragem tributária
Publicado em Dez, 10, 2013

A resolução pela arbitragem dos litígios entre os contribuintes e a administração fiscal foi, inquestionavelmente, uma medida legislativa corajosa, ao assumir que a justiça tributária pode também ser alcançada, com um idêntico rigor, fora do sistema público de tribunais fiscais.

O rigor e a celeridade na resolução dos litígios fiscais exigem uma crescente eficiência dos tribunais fiscais medida pelo tempo e número de pendências. Como tal, a disponibilidade de uma via alternativa - a arbitragem tributária - poderá ser determinante para a resolução desses conflitos.

O rigor na solução de litígios fiscais que, a par da celeridade, deve ser uma pedra de toque da arbitragem tributária, obriga quem seja chamado a resolvê-los a conjugar sólidas competências na área do direito fiscal, também no domínio das ciências económicas.

A crescente complexidade dos litígios fiscais pode ser mais eficazmente lidada através da estreita colaboração entre juristas e economistas, reunindo o conhecimento das ciências económicas e o conhecimento de direito fiscal.

Ora, esta necessária estreita colaboração entre juristas e economistas poderá ser facilmente alcançável no seio da arbitragem tributária, dada a maior flexibilidade nas suas regras de funcionamento e a sua focalização na pronta e qualificada resolução dum litígio fiscal.

O que se referiu em relação à resolução de litígios fiscais alarga-se a um sem número de outros exemplos, onde o paradigma para lidar com situações complexas passou a ser a interdisciplinaridade e a colaboração entre profissionais qualificados de diferentes áreas e não já o do profissional com conhecimentos enciclopédicos de várias ciências.
A Ordem dos Economistas está bem ciente deste dominante paradigma e, em coerência, procurou ser, no contexto das designadas profissões liberais, um agente dinamizador dessa interdisciplinaridade, mais do que uma zelosa guardiã de fronteiras profissionais imutáveis e de privilégios corporativos injustificados.

Esta posição da Ordem dos Economistas tem sido assumida, no contexto das profissões que tem por base o domínio e aplicação das ciências económicas, pela defesa dum modelo organizativo (o qual funciona bem, por exemplo, em Espanha), que agrupasse, numa única organização, os que dominam e aplicam, na sua atividade profissional, os diferentes ramos daquelas ciências económicas.

Fruto de condicionalismos históricos que já deixaram de fazer sentido, as várias profissões qualificadas na área das ciências económicas deram origem e continuam a ser representadas por distintas Associações Públicas Profissionais.

O mesmo fenómeno também se observa em várias outras profissões liberais.

Admitia-se que a Lei nº 2/2013, de 10 de janeiro, que resulta do cumprimento dum compromisso assumido no Memorando de Entendimento, pudesse constituir uma oportunidade para se inverter esta tendência de atomização das Associações Públicas Profissionais, impulsionando o movimento inverso de agregação, o que, por si só, fomentaria e facilitaria a interdisciplinaridade e colaboração entre profissionais qualificados que passassem a fazer parte duma única organização profissional, potencialmente mais eficaz.

Esta Lei nº 2/2013 veio introduzir um novo regime jurídico das Associações Públicas Profissionais, e obrigava as várias Ordens e Câmaras Profissionais a ajustarem os seus estatutos àquele novo regime.

A revisão dos estatutos das diversas Associações Públicas Profissionais existentes poderia, assim, constituir uma oportunidade para o Governo dinamizar, em estreito diálogo com as Ordens Profissionais, um processo, quanto mais não fosse, de avaliação de viabilidade de se verificarem fusões entre Associações Públicas Profissionais já existentes.

Em vários países, como a Espanha e a Itália, verificou-se esse movimento.

Na falta desse movimento agregador, que necessariamente deveria partir duma iniciativa do Governo que a Lei nº 2/2013 aliás legitimaria, a Ordem dos Economistas centrou o melhor dos seus esforços, no processo de revisão do seu estatuto, para contrariar a preocupante tendência, que também se vem observando noutras profissões liberais, de pulverização de organizações profissionais, pela criação de novas Associações Públicas Profissionais que passam a representar meros segmentos duma mesma profissão liberal.

Na revisão do seu estatuto, atempadamente apresentada ao Governo, a Ordem dos Economistas sugeriu o reconhecimento de oito novas especialidades profissionais, para além das quatro já existentes (Economia Política, Gestão Empresarial, Auditoria e Análise Financeira). Entre estas oito novas especialidades profissionais, conta-se a de Peritagem Judicial e Arbitragem Comercial e Tributária.

Ao propor o reconhecimento desta especialidade profissional, a Ordem dos Economistas não pretende que apenas possam servir como peritos judiciais e árbitros judiciais os economistas que se encontrem inscritos naquele novo Colégio. Apenas a Ordem dos Economistas certificará que os inscritos naquele Colégio estão aptos a praticar, com o necessário rigor, os atos típicos daquelas atividades profissionais.

A Ordem dos Economistas pretende assim posicionar-se como um fórum de discussão e de formação e como dinamizador da criação de redes entre profissionais. A par da salvaguarda de normas deontológicas, aqui radica o fundamental da sua utilidade social.

Se, por Lei da Assembleia da República, vier a ser reconhecida, na profissão de Economista, a especialidade de Peritagem Judicial e Arbitragem Comercial e Tributária, a Ordem dos Economistas não deixará de procurar, como aliás o tem feito noutros casos recentes de reconhecimento de novas especialidades profissionais, a colaboração com estruturas já existentes e com intervenção consolidada no terreno.

O que necessariamente implica lançar um desafio ao CAAD para a institucionalização de mecanismos permanentes de colaboração que se antecipa como mutuamente vantajosa, mas salvaguardando, como não podia deixar de o ser, a autonomia de ambas as organizações.

A arbitragem tributária deve, portanto, inserir-se como mais uma peça chave na estratégia de captação de investimento, cujo sucesso é crítico para a saída da atual crise e que consiste em assegurar ao potencial investidor regras fiscais simples, estáveis e aplicáveis com rigor e celeridade.

Estamos ainda em crer que o reforço institucional das relações entre o CAAD e a Ordem dos Economistas poderia também contribuir para uma justiça fiscal mais célere e rigorosa, o que em muito contribuiria para o fomento das atividades económicas e, em última instância, para o crescimento e desenvolvimento da economia, por todos desejado. Fica assim lançado o repto.

Lisboa, Novembro de 2013

Rui Leão Martinho


Economista


Bastonário da Ordem dos Economistas

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